“A força de Cristo te criou, a fraqueza de Cristo te recriou. A força de Cristo fez com que existisse o que não existia; a fraqueza de Cristo fez com que o que existia não viesse a perecer; criou-nos com sua força, nos resgatou com sua fraqueza” (Santo Agostinho)
1. Não cessamos, ao longo do caminho de nossa vida cristã, de contemplar as misericórdias que Deus fez e vai derramando em nossa vida, na vida da Igreja e nos corações das pessoas retas e de boa vontade através do irrestrito amor do Senhor Jesus. Sim, dizemos bem, Senhor. Hoje o contemplamos sempre como aquele que venceu a morte e está no meio de nós na qualidade de Ressuscitado. Por isso, é o Senhor Jesus. Ele, o vivo, nos fala, nos alimenta, nos encoraja, pede asilo em nosso interior. Mas, nesse empenho de alimentar o enamoramento pelo Esposo, não podemos deixar de meditar no Cristo histórico, nas circunstâncias que cercaram os últimos momentos de sua vida, na força que existia em sua fragilidade.
2. Santo Agostinho, no breve texto que colocamos no frontispício desta reflexão, faz uma comparação entre força e fragilidade. A força de Cristo, isto é, o Verbo que é Deus, criou e cria a todos e a tudo. Na fragilidade da rosa que desabrocha, no fiozinho de água que corre pedra abaixo, na criança que nasce agora na maternidade, Deus cria. Extasiamo-nos diante dessa admirável criação. Tudo fervilha. Tudo tem a força daquele que cria. Francisco de Assis compreendeu muito bem e ficava como que extasiado considerando-se irmão de tudo o que estava sendo criado. A força de Cristo cria o homem, faz com que exista o que antes não existia, colocou-nos na existência com sua força.
3. Agora, a outra face da moeda: pela fragilidade do condenado à morte, daquele que foi suspenso entre o céu e a terra fomos resgatados, reconduzidos à terra prometida. Nada de milagres extraordinários, mas gestos que culminam na fragilidade da cruz, no abandono de um impotente e indefeso. Lembramo-nos de Paulo que afirma ser forte quando é fraco. Não se trata de defender uma espécie de neurose de busca de sofrimento. Uma certa religião do passado gostava de cantar loas às macerações do corpo e se regozijar tolamente em fracassos quase que buscados. Ora, não é isso que vemos no Cristo da cruz. Tudo o que ele ali vive lhe parece um absurdo. Tem vontade de gritar, mas sua voz não é ouvida. Ninguém o defende. Os que antes o rodeavam e procuravam desaparecem. Não tem advogados. Ouve, quem sabe, o choro sereno da mãe ao pé da cruz e parece sentir que o Pai está distante. Grita mesmo: “Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?” Tudo extremamente frágil. E quando se entrega nos braços do Pai e abraça a morte ama doidamente, entrega-se irrestritamente e depois de morto ainda o esvaziamento de todo o seu interior: os fiapos de água e de sangue que saem do Coração aberto. E fomos salvos na força da fragilidade daquele que foi suspenso, morreu entregando-se sem limites.
4. Bela lição! Temos nossos projetos e nossos sonhos os mais lícitos. Queremos para nossos filhos o melhor. E um deles se perde no mundo da droga. Queríamos que nosso irmão fosse feliz e fiel no casamento e o vemos todo desarrumado interiormente. Nosso irmão vive sem viver. Tudo isso nos faz sofrer. A mulher tem um filho especial que sempre precisará dela. Ela não é mais dona de seu tempo. Seu amor generoso cria vida na vida do filho. Os devotos do Coração de Jesus não têm uma piedade “dolorista”, mas sabem que amando na fragilidade e na impotência, contemplando o esvaziamento do peito de Cristo são recriados, refeitos, renovados. A força de Deus, com efeito, costuma se manifestar na fraqueza.
5. Terminamos esta reflexão com palavras de Cesário de Arles: “Cristo foi ferido para curar nossas feridas; morreu para libertar-nos da morte perpétua; desceu à mansão dos mortos para arrancar-nos da goela do crudelíssimo leão; ressuscitou para dar-nos a esperança da ressurreição; subiu ao céu para mostrar onde veremos segui-Lo”
Frei Almir Ribeiro Guimarães
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