1. A paz, fruto do Espírito
Depois de refletir sobre a paz como dom de Deus em Cristo Jesus para toda a humanidade e sobre a paz como tarefa pela qual trabalhar, vamos agora falar da paz como fruto do Espírito. São Paulo coloca a paz em terceiro lugar entre os frutos do Espírito: “O fruto do Espírito”, diz ele, “é amor, alegria, paz, paciência, benevolência, bondade, fidelidade, mansidão, domínio próprio” (Gl 5, 22).
Descobrimos o que são os "frutos do Espírito" ao analisar, justamente, o contexto dessa ideia. O contexto é o da luta entre a carne e o espírito, isto é, entre o princípio que regula a vida do homem velho, cheio de concupiscências e desejos terrenos, e o que regula a vida do homem novo, guiado pelo Espírito de Cristo. Na expressão "frutos do Espírito", "Espírito" não indica o Espírito Santo em si mesmo, mas o princípio da nova vida, ou "o homem que se deixa guiar pelo Espírito".
Diferentemente dos carismas, que são obra exclusiva do Espírito, que os dá a quem quer e quando quer, os frutos são o resultado de uma colaboração entre a graça e a liberdade. Eles são, portanto, o que hoje queremos dizer por virtude, se dermos a essa palavra o sentido bíblico de um agir habitual "segundo Cristo", ou "segundo o Espírito", em vez do sentido filosófico aristotélico de um agir habitual "de acordo com a reta razão". Além disso, os dons do Espírito são diferentes de pessoa para pessoa, enquanto os frutos do Espírito são os mesmos para todos. Nem todos na Igreja podem ser apóstolos, profetas, evangelistas; mas todos indistintamente, do primeiro ao último, podem e devem ser caridosos, pacientes, humildes, pacíficos.
A paz fruto do Espírito é, portanto, diferente da paz como dom de Deus e da paz como tarefa pela qual trabalhar. Ela indica a condição habitual (habitus), o estado de ânimo e o estilo de vida de quem, mediante o esforço e a vigilância, chegou a certa pacificação interior. A paz fruto do Espírito é a paz do coração. E é dessa coisa tão bela e tão desejada que vamos falar hoje. Ela é diferente, sim, da tarefa de sermos pacificadores, mas nos ajuda maravilhosamente a atingir este objetivo. O título da mensagem do papa João Paulo II para a Jornada Mundial da Paz de 1984 era "A paz nasce de um coração novo". E Francisco de Assis, ao mandar os seus frades para todo o mundo, lhes recomendava: “A paz que anunciais com a boca, tende-a primeiro nos vossos corações”[1].
2. A paz interior na tradição espiritual da Igreja
Alcançar a paz interior ou do coração foi um empenho de todos os grandes buscadores de Deus ao longo dos séculos. No Oriente, a começar pelos Padres do deserto, esse empenho se concretizou no ideal da hesychia, da quietude, que ousou propor uma perspectiva altíssima, se não até sobre-humana: retirar da mente todo pensamento, retirar da vontade todo desejo, retirar da memória toda lembrança, para deixar à mente só o pensamento de Deus, à vontade só o desejo de Deus e à memória só a lembrança de Deus e de Cristo (amneme Theou). Uma luta titânica contra os pensamentos (logismoi), não só os maus, mas também os bons. Exemplo extremo desta paz obtida com uma guerra feroz veio a ser, na tradição monástica, o monge Arsênio, que, à pergunta “o que devo fazer para me salvar?”, ouviu a resposta de Deus: “Arsênio, foge, cala e mantém-te em quietude” (literalmente, pratica a hesychia)[2].
Mais tarde, essa corrente espiritual dará espaço à prática da oração do coração, ou oração ininterrupta, ainda hoje amplamente praticada na cristandade oriental e da qual "Os contos de um peregrino russo" representam a expressão mais fascinante. No início, porém, ela não se identificava com essa prática. Era uma maneira de se chegar à perfeita tranquilidade do coração; não uma tranquilidade vazia, um fim em si mesma, mas uma tranquilidade plena, semelhante à dos bem-aventurados, um começar a viver na terra a condição dos santos no céu.
A tradição ocidental perseguiu o mesmo ideal, mas de outras maneiras, acessíveis tanto àqueles que praticam a vida contemplativa quanto aos que praticam uma vida ativa. A reflexão começa com Agostinho. Ele dedica um livro inteiro da Cidade de Deus a refletir sobre as diversas formas da paz, dando a cada uma delas uma definição que fez escola até a nossa época, incluindo a da paz como "tranquillitas ordinis", a tranquilidade da ordem. Mas é principalmente com o que diz nas Confissões que ele influenciou os traços do ideal da paz do coração.
Ele dirige a Deus, no início do livro e como que de passagem, palavras destinadas a ter uma ressonância imensa em todo o pensamento posterior: “Fizeste-nos para ti e o nosso coração está inquieto enquanto não repousa em ti”[3]. Mais adiante, ele ilustra esta afirmação com o exemplo da gravidade.
“Na boa vontade está a nossa paz. Todo corpo, devido ao seu peso, tende ao lugar que lhe é próprio. Um peso não puxa somente para baixo, mas para o lugar que lhe é próprio. O fogo tende ao alto, a pedra ao chão, impulsionados ambos pelo seu peso a buscar o seu lugar… O meu peso é o meu amor; ele me leva para onde eu me levo”.[4]
Enquanto estamos nesta terra, o lugar do nosso repouso é a vontade de Deus, o abandono aos seus quereres. “Não se acha descanso se não se consente à vontade de Deus sem resistência”[5]. Dante Alighieri resumirá este pensamento agostiniano em seu célebre verso: “Na sua vontade está a nossa paz”[6].
Só no céu é que esse lugar de repouso será Deus mesmo. Agostinho termina, por isto, a sua abordagem do tema da paz fazendo um elogio apaixonado à paz da Jerusalém do céu, que vale a pena ler para nos inflamarmos nós também do seu desejo:
“Há também a paz final […] Naquela paz não é necessário que a razão domine os impulsos, porque eles não existirão, mas Deus dominará o homem, a alma espiritual o corpo e será tão grande a serenidade e a disponibilidade à submissão quanto é grande a delícia de viver e dominar. E então, em todos e em cada um, esta condição será eterna e teremos a certeza de que é eterna e, por isso, a paz de tal felicidade, ou seja, a felicidade de tal paz, será o sumo bem”[7].
A esperança desta paz eterna marcou toda a liturgia dos fiéis defuntos. Expressões como “paz”, “na paz de Cristo”, “descanse em paz” são as mais frequentes nos túmulos dos cristãos e nas preces da Igreja. A Jerusalém celeste, com alusão à etimologia do nome, é definida como “beata pacis visio”[8], bem-aventurada visão de paz.
3. O caminho da paz
A concepção de Agostinho sobre a paz interior como adesão à vontade de Deus é confirmada e aprofundada pelos místicos. Mestre Eckhart escreve: “Nosso Senhor diz: ‘Somente em mim tereis a paz’ (cf. Jo 16,33). Quanto mais se penetra em Deus, mais se penetra na paz. Quem já tem o seu ‘eu’ em Deus tem a paz; quem tem o seu ‘eu’ fora de Deus não tem a paz”[9]. Não se trata, pois, apenas de aderir à vontade de Deus, mas de não ter outra vontade se não a de Deus, de morrer de todo à própria vontade. A mesma coisa se lê, na forma de experiência vivida, em Santa Ângela de Foligno: “A divina bondade, de duas vontades, fez só uma, de modo que não posso querer a não ser como Deus quer […] Não me encontro mais na condição costumeira, mas fui conduzida a uma paz em que estou com Ele e contente de tudo”[10].
Outro desenvolvimento, mais ascético do que místico, é o de Santo Inácio de Loyola com a sua doutrina da “santa indiferença”[11]. Ela consiste em colocar-se em estado de total disponibilidade para acolher a vontade de Deus, renunciando, desde o começo, a toda preferência pessoal, como uma balança pronta a se inclinar para o lado que tiver o maior peso. A experiência da paz interior se torna assim o critério principal em todo discernimento. Deve ser considerada em conformidade com o querer de Deus a escolha que, após prolongada ponderação e oração, for acompanhada de maior paz do coração.
Nenhuma corrente espiritual saudável, porém, nem no Oriente, nem no Ocidente, jamais pensou que a paz do coração seja uma paz barata e sem esforço. A seita do "livre Espírito" tentou argumentar o contrário na Idade Média, assim como o movimento quietista no século XVII, mas ambos foram condenados pela hierarquia e pela consciência da Igreja. Para manter e aumentar a paz do coração é preciso domar, momento a momento, em especial no início, uma revolta: a da carne contra o espírito.
Jesus tinha dito de mil maneiras: "Se alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo"; "quem ama a própria vida a perderá, mas quem perder a sua vida a encontrará" (Mc 8, 34). Existe uma falsa paz que Jesus diz que veio para tirar, e não para trazer à terra (cf. Mt 10, 34). Paulo traduzirá tudo isso em uma espécie de lei fundamental da vida cristã:
“Os que vivem segundo a carne gostam do que é carnal; os que vivem segundo o espírito apreciam as coisas que são do espírito. Ora, a aspiração da carne é a morte, enquanto a aspiração do espírito é a vida e a paz. Porque o desejo da carne é hostil a Deus, pois a carne não se submete à lei de Deus, nem o pode. Os que vivem segundo a carne não podem agradar a Deus [...] Se viverdes segundo a carne, haveis de morrer; mas, se pelo Espírito mortificardes as obras da carne, vivereis” (Rm 8, 5-13).
A última frase contém um ensinamento importantíssimo. O Espírito Santo não é a recompensa para os nossos esforços de mortificação, mas o que os torna possíveis e frutuosos; não só no final, mas também no início do processo: “Se, mediante o Espírito, fizerdes morrer as obras do corpo, vivereis”. Neste sentido é que se diz que a paz é fruto do Espírito; é o resultado do nosso esforço, possibilitado pelo Espírito de Cristo. Uma mortificação voluntarista e confiante demais em si mesma pode se tornar, ela própria, uma obra da carne (e se tornará com frequência).
Entre aqueles que ilustraram ao longo dos séculos este caminho para a paz do coração, destaca-se, pela concretude e pelo realismo, o autor da Imitação de Cristo. Ele imagina uma espécie de diálogo entre o Divino Mestre e o discípulo, como entre um pai e seu filho:
Mestre: "Meu filho, hei de ensinar-te o caminho da paz e da verdadeira liberdade".
Discípulo: "Faze, Senhor, como dizes; de bom grado escutarei teus ensinamentos".
Mestre: "Cuida, meu filho, de fazer a vontade dos outros em vez da tua própria. Escolhe sempre ter menos que mais. Procura sempre ocupar o lugar mais baixo e ser inferior a todos. Deseja sempre, e ora, para que em ti se faça inteiramente a vontade de Deus. O homem que assim procede entra no reino da paz e da tranquilidade".
Outro meio sugerido ao discípulo é evitar a vã curiosidade:
“Filho, não sejas curioso; não te afanes inutilmente. Que te importa aquilo ou isto? ‘Tu, segue-me’ (Jo 21,22). Que te importa que tal pessoa seja assim ou diferente, ou que a outra aja e diga isso ou aquilo? Não terás que responder pelos outros, mas renderás contas de ti mesmo. Eis que eu conheço a todos, vejo tudo o que acontece sob o sol e sei a condição de cada um: o que pensa, o que quer, a que mira a sua intenção. Tudo deve ser, portanto, colocado em minhas mãos. E tu, mantém-te em paz segura, deixando os outros se agitarem a seu critério: o que eles fizerem recairá sobre eles, pois a mim não podem enganar” [12].
4. “Paz porque em ti tem confiança”
Sem a pretensão de substituir esses meios ascéticos tradicionais, a espiritualidade moderna enfatiza outros meios mais positivos para se manter a paz interior. O primeiro é a confiança e o abandono em Deus. “Tu lhe assegurarás a paz, paz porque em ti tem confiança”, lemos em Isaías (26, 3). Jesus, no Evangelho, motiva o seu convite a não temermos e a não nos inquietarmos com o amanhã no fato de que o Pai Celestial sabe do que precisamos, ele que alimenta as aves do céu e veste os lírios do campo (cf. Mt 6, 5).
Esta é a paz de que Santa Teresa do Menino Jesus se tornou mestra e modelo. Um exemplo heroico desta paz que vem da confiança em Deus também vem do mártir do nazismo Dietrich Bonhöffer. Preso e em aguardo da execução, ele escreveu alguns versos que se tornaram um hino litúrgico em muitos países anglo-saxônicos:
Envoltos em maravilha por forças amigas, esperamos confiantes o porvir.
Deus está conosco de noite e de manhã, estará conosco em cada novo dia[13].
Um estudioso franciscano, Eloi Leclerc, em seu livro A sabedoria de um pobre, relata como Francisco de Assis encontrou a paz num momento de profunda perturbação. Ele estava entristecido com a resistência de alguns ao seu ideal e sentia o peso da responsabilidade pela numerosa família que Deus lhe tinha confiado. Partiu de Verna e foi a São Damião para se encontrar com Clara. Clara o escutou e, para dar-lhe ânimo, apresentou um exemplo.
“Suponhamos que uma de nossas irmãs viesse pedir-me desculpas por ter quebrado um objeto. Bem, eu lhe faria, sem dúvida, uma observação e lhe daria, como de costume, uma penitência. Mas se ela viesse dizer-me que havia posto fogo ao convento e que tudo foi queimado ou quase, creio que, neste caso, eu nada teria a dizer. Eu me surpreenderia perante um evento maior que eu. A destruição do convento é um fato grande em demasia para que eu possa ficar por ele profundamente perturbada. O que o próprio Deus construiu não pode basear-se na vontade ou no capricho de uma criatura humana. O edifício de Deus se alicerça em bases muito mais sólidas”.
Francisco compreendeu a lição e respondeu:
“O porvir desta grande família religiosa que o Senhor confiou aos meus cuidados constitui um fato importante demais para que possa depender de mim sozinho e das minhas frágeis forças e para que eu fique por ele perturbado. É um fato de Deus. Bem o disseste. Mas reza para que esta palavra floresça em mim como semente de paz”[14].
O Pobrezinho retornou resserenado para junto dos seus, repetindo para si mesmo ao longo do caminho: "Deus existe e isto basta! Deus existe e isto basta!". Não é um episódio historicamente documentado, mas interpreta bem, no estilo dos Fioretti, um momento da vida de Francisco.
Nós nos aproximamos do Natal e eu gostaria de destacar o que considero o mais eficaz para conservarmos a paz do coração: a certeza de sermos amados por Deus. "Paz na terra aos homens por Deus amados", ou, literalmente, "Paz na terra aos homens do (divino) beneplácito (eudokia)" (Lc 2, 14). A Vulgata traduzia esse termo como "boa vontade" (bonae voluntatis), entendendo com ela a boa vontade dos homens, ou os homens de boa vontade. Mas é uma interpretação errada, hoje reconhecida por todos como tal, embora, por deferência à tradição, o Glória da Missa continue dizendo, pelo menos em alguns idiomas, “e paz na terra aos homens de boa vontade”. As descobertas de Qumran trouxeram a prova definitiva. "Homens, ou filhos, da benevolência" é como são chamados, em Qumran, os filhos da luz, os eleitos da seita[15]. Trata-se dos homens que são objeto da benevolência divina.
Para os essênios de Qumran, “o divino beneplácito” discrimina; aplica-se somente aos adeptos da seita. No Evangelho, "os homens da divina benevolência" são todos os homens, sem exceção. É como dizer "os homens nascidos de mulher": não se quer dizer que alguns nasceram de mulher e outros não; o que se quer é caracterizar a todos os homens de acordo com a sua maneira de vir ao mundo. Se a paz fosse concedida aos homens pela sua "boa vontade", seria limitada a poucos, àqueles que a merecem; mas, como ela é concedida pela boa vontade de Deus, pela graça, é oferecida a todos.
"Assueta vilescunt", diziam os latinos; as coisas repetidas muitas vezes perdem vigor, e isto acontece, infelizmente, também com as palavras de Deus. Temos que fazer com que isto não aconteça neste Natal. As palavras de Deus são como fios elétricos desencapados. Se os tocamos, levamos um choque; já se não houver corrente ou estivermos de luvas isolantes, podemos manejá-los como quisermos e não receberemos choque algum. O poder e a luz do Espírito estão sempre em ato, mas depende de nós recebê-los, por meio da fé, do querer e da oração. Quanta força, quanta novidade continham aquelas palavras, "Paz na terra aos homens amados pelo Senhor", quando foram proclamadas pela primeira vez! Devemos renovar o nosso ouvido, como o ouvido dos pastores que as ouviram pela primeira vez e, "sem demora", se puseram a caminho.
São Paulo nos indica um modo de superar todas as nossas ansiedades e reencontrar toda vez a paz de coração, mediante a certeza de sermos amados por Deus. Escreve ele:
“Se Deus é por nós, quem será contra nós? Aquele que não poupou seu próprio Filho, mas que por todos nós o entregou, como não nos dará também com ele todas as coisas? [...] Quem nos separará do amor de Cristo? A tribulação? A angústia? A perseguição? A fome? A nudez? O perigo? A espada? [...] Mas, em todas essas coisas, somos mais que vencedores pela virtude daquele que nos amou” (Rm 8, 31-37).
A perseguição, os perigos, a espada não são uma lista abstrata ou imaginária; são os motivos de angústia que ele experimentou, de fato, na vida; ele os descreve amplamente na segunda carta aos coríntios (cf. 2 Cor 11, 23). O apóstolo os revisa na mente e constata que nenhum é forte o suficiente para resistir à comparação com o pensamento do amor de Deus. Implicitamente, o Apóstolo nos convida a fazer o mesmo: olhar para a nossa vida tal como ela se apresenta, trazer à tona os medos e motivos de tristeza aninhados nela e que não nos deixam aceitar serenamente a nós mesmos: aquele complexo, aquele defeito físico ou moral, aquele insucesso, aquela lembrança dolorosa; expor tudo isso à luz do pensamento de que Deus nos ama e concluir com o Apóstolo: "Em todas estas coisas, posso ser mais do que vencedor, pela virtude daquele que me amou".
Da sua vida pessoal, o Apóstolo passa, logo em seguida, a considerar o mundo ao seu redor. Ele escreve:
“Pois estou persuadido de que nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem o presente, nem o futuro, nem as potestades, nem as alturas, nem os abismos, nem outra qualquer criatura nos poderá apartar do amor que Deus nos testemunha em Cristo Jesus, nosso Senhor” (Rm 8, 37-39).
Ele observa o "seu" mundo, com os poderes que o tornavam ameaçador: a morte com o seu mistério, a vida presente com as suas seduções, as forças astrais ou infernais que incutiam tanto terror ao homem velho. Somos convidados, nós também, a fazer o mesmo: olhar, à luz do amor de Deus, para o mundo que nos rodeia e que nos faz ter medo. O que Paulo chama de "altura" e "profundidade" são para nós o infinitamente grande e o infinitamente pequeno, o universo e o átomo. Tudo está pronto para nos esmagar; o homem é fraco e sozinho num universo muito maior do que ele e, além disso, ainda mais ameaçador agora, com as atuais descobertas científicas, as guerras, as doenças incuráveis, o terrorismo... Mas nada disso pode nos separar do amor de Deus. Deus existe e isto basta!
Santa Teresa de Ávila nos deixou uma espécie de testamento, que nos convém repetir toda vez que precisarmos reencontrar a paz do coração: "Nada te perturbe, nada te assuste; tudo passa, Deus não muda; a paciência consegue tudo; a quem tem Deus, nada falta. Só Deus basta”[16].
Que o Natal de nosso Senhor, Santo Padre, veneráveis padres, irmãos e irmãs, seja realmente para nós, como dizia São Leão Magno, “o natal da paz”[17]! Das três dimensões da paz: a paz entre o céu e a terra, a paz entre todos os povos e a paz em nossos corações. T
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Tradução de Zenit.
[1] Legenda dos três companheiros, 58 (Fontes Franciscanas, 1469)
[2] Apophtegmata Patrum, Arsênio 1-3 (J.C. GUY, ed., I padri del deserto. Così dissero, così vissero, Milano 1997, 29).
[3] Santo Agostinho, Confissões, I, 1.
[4] Ib. XIII, 9.
[5] Santo Agostinho, Adnotationes in Iob, 39
[6] Dante Alighieri, Paraíso, 3, v.85
[7] Santo Agostinho, A cidade de Deus, XIX, 27.
[8] Hino do ofício da dedicação da Igreja.
[9] Meister Eckhart, Prédicas, 7 (Ed. J. Quint, Deutsche Werke, I,. Stuttgart 1936, pág. 456)
[10] Il libro della Beata Angela, VII (ed. Quaracchi, 1985, p. 296).
[11] Cf. G. Bottereau, Indifference, em “Dictionnaire de Spiritualité , vol 7, 1688 ss.
[12] Imitação de Cristo, III, 23-24.
[13] Von guten Mächten wunderbar geborgen /erwarten wir getrost, was kommen mag.
Gott ist mit uns am Abend und am Morgen / und ganz gewiss an jedem neuen Tag.
[14] E. Leclerc, La sagesse d’un pauvre, Paris, Desclée de Brouwer, 22e éd. 2007.
[15] Cf Inni, I QH, IV, 32 s, (XI, 9) (I manoscritti di Qumran, organização de L. Moraldi, UTET, Turim 1971, págs. 386 e 428).
[16] “Nada te turbe, nada te espante, todo se pasa, Dios no se muda; la paciencia todo lo alcanza; quien a Dios tiene nada le falta. Solo Dios basta”.
[17] São Leão Magno, Sermo de Nativitate Domini, XXXVI, 5 (PL 54, 215).
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