Encontro muitas pessoas que me perguntam: “E aí, padre, correndo muito?”. No começo, eu sentia a obrigação de fazer um relatório completo das mil e uma atividades que me roubavam preciosas horas de sono e ocupavam minha escrivaninha com montes e montes de pastas a considerar e agendas que eu deveria cumprir. Aos poucos, fui percebendo que a sociedade moderna está doente da síndrome da dispersão. Sim, já virou doença. O estresse e a depressão são apenas sintomas dessa causa mais profunda.
Até o que seria um momento de lazer torna-se estressante naquele trânsito parado na descida ou na subida da serra, na padaria que não dá conta dos clientes de fim de semana ou na corrida por aquele pequeno lugar da disputada praia. Estamos doentes. As igrejas multiplicam pastorais e movimentos, nos quais, necessariamente, os cristãos devem estar engajados. Tudo bem. Mas acontece que muitos pertencem a duas, três e até quatro pastorais e simplesmente vivem a semana toda na igreja, muito mais do que com suas próprias famílias.
Padres resolvem ser políticos e médicos pretendem ser gurus; psicólogos querem ser sacerdotes e políticos imaginam ser “deuses”.Todos sentem a obrigação de saber quase nada sobre quase tudo. A superficialidade é filha primogênita da dispersão. Fazemos um amontoado de coisas sem qualidade. Somos obrigados a atingir metas de qualidade total... ou seria de quantidade total?! Nesse caminho, a modernidade enlouquecerá.
Vamos acelerando o carro e, quando percebemos, já passamos, e muito, da velocidade máxima permitida. Reduzir para os 100 quilômetros por hora chega a ser frustrante para aquele que está contaminado pela “síndrome da dispersão”. Parar, então, é simplesmente uma tortura. A ausência da adrenalina pode provocar até doenças físicas. Pasme: estamos viciados em trabalho, perigo e violência. O refrão dessa tragédia é sempre o mesmo: não tenho tempo, não tenho tempo, não tenho tempo! Esta é a cantilena que escutam filhos carentes, namoradas com saudades, esposas e maridos, aquela vovó que espera ansiosa a visita de seus filhos e netos.
Sei que estou sendo radical, mas também sei que apenas uma surra da vida costuma tornar possível a cura da síndrome da dispersão. Existem os que ficam realmente doentes e procuram um médico. O problema é que muitos profissionais da saúde têm a mesma doença e resolvem seu próprio problema receitando, irresponsavelmente, uma quantidade enorme de medicamentos que irão tapar o sol com a peneira. É o milagre instantâneo provocado por medicações recentes. Mas sabemos que administrar essa medicação exige criar condições para que o paciente mude suas condições de vida. O terapeuta também deverá ser “paciente”.
Refleti muito sobre a raiz mais profunda dessa síndrome e percebi que é aquele mesmo desejo humano relatado já nas primeiras páginas da Bíblia e que originou os outros pecados: “Vós sereis deuses”.
Deixe Deus ser Deus. Somos apenas humanos, feitos de terra e um sopro; somos frágeis. Os sábios não sabem tudo nem fazem tudo, mas saboreiam aquilo que fazem. Sabedoria é saber com sabor. Faça poucas coisas, mas as faça bem.
Teresinha do Menino Jesus, santa das pequenas coisas, rogai por nós!
(Extraído do livro "Pronto, falei!")
Padre Joãozinho, SCJ
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